Uma questão de confiança

Tenho uma ex-aluna que está estudando no exterior. Sabendo que eu também já passei por essa experiência, ela me perguntou como eu fiz para conquistar amigos. Calma! Eu não irei reproduzir aqui um daqueles programas de rádio, tipo “Falando ao coração”. Apenas fiquei intrigada com o fato das pessoas procurarem uma fórmula ou rótulo adequado para a amizade.

Tudo bem admito que quando tinha a idade dela eu também era assim. Buscava uma fórmula perfeita e nunca achava. É comum ficarmos frustados por questões de amizade. Talvez isso ocorra porque as nossas expectativas estão muito elevadas.

Sinceramente, eu disse a ela que não tinha conselhos a dar. Tudo o que sei e acredito hoje está baseado em experiências pessoais. Servem apenas para mim e, particularmente, admito que sou bem cabeça-dura (para não dizer kamikaze). Literalmente eu preciso viver a experiência, mesmo sabendo que quebrarei a cara, para internalizar. Gosto desse processo. Aprendi, por exemplo, a aceitar aquilo que as pessoas podem dar, sem grandes idealizações. Aprendi também que uma bonita amizade pode surgir de onde você menos espera. Quando morei em Madrid, um euro era equivalente a quatro reais. Fui sem bolsa e sem conhecer qualquer pessoa que tenha passado por um processo semelhante e pudesse me auxiliar. A proprietária do apartamento que aluguei exigiu o pagamento de 3 meses adiantado e isso fez com que todas as minhas economias se esvaissem. Ao mesmo tempo, eu estava tentando tirar a minha carteira nacional de estudante (essencial para a minha permanência no país) e, para a minha surpresa, a Imigração espanhola exigiu que eu tivesse em conta correte o equivalente a cinco mil euros! Naquela época esse valor era equivalente a vinte mil reais!! Por pouco meu sonho de estudar fora não ruiu. Meus pais estavam loucos buscando alternativas, quando uma peruana (amiga de uma amiga) simplesmente me emprestou. Sim! Ela depositou cinco mil euros na minha conta! O nome dela é Monique. Definitivamente ela não se encaixava no padrão que eu tinha criado para os amigo. Eu conversava com ela, mas nunca fomos íntimas. No entanto, na hora em que mais precisei, foi ela que apareceu, sem eu pedir. Confesso que fiquei com vergonha. Naquela época, eu confessei a ela que dificilmente faria isso por uma amiga – e até mesmo por ela. Não que isso justifique, mas na minha família já ocorreram diversos casos de brigas por causa de dinheiro. Ela simplesmente respondeu que confiava em mim e que isso bastava. Seu dinheiro ficou 3 meses na minha conta. Todo santo dia, desesperadamente, eu tentava devolver e não conseguia. Monique pedia para eu guardar, para ela não gastar. Ela fez com que eu alterasse completamente todos os meus conceitos sobre amizade.


De um amigo especial eu sinto muitas saudades. FAG. Eu sempre tive mais amigos homens (sempre detestei as frescuras tipicamente femininas). Eles me ensinaram o real valor da amizade. Aprendi com eles que não é preciso estar grudado o tempo todo, ou compartilhar todos os segredos para estar presente ou ser confiável e leal. No meio das minhas crises existenciais, FAG se abalava de ônibus até a minha casa (o trajeto durava mais ou menos 1 hora e meia) só para me ouvir, sem criticar. Ele me conhecia tanto, que quando brigávamos (na maioria das vezes por culpa minha), ele esperava, pacientemente, pela minha mudança de humor. Gentilmente, eu me reaproximava, fingindo que nada tinha acontecido e ele não exigia nada. Nem um pedido de desculpas. Quando eu conto essa história para céticos, eles insistem em dizer que não era amizade e sim interesse, amor não correspondido. Como se não fosse possível a amizade entre homem e mulher. Sim, era amizade, das boas e sinceras. Que saudade.


2 thoughts on “Uma questão de confiança”

  1. Paloma,

    Não se você se lembra de mim, mas sou a Fernanda, da consultoria Bretzke, que trabalhou com Elmo.
    Gostei muito de como você escreve! Parabéns!
    Vou acompanhar seu blog agora!

    []s,

    Fernanda.

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