Ouvindo um podcast hoje de manhã, parei para pensar no por quê de eu ter demorado tanto para escrever o meu primeiro livro?
Desde que me entendo por gente, eu tinha vontade de escrever, mas eu empurrava essa necessidade para debaixo do tapete. Não era intencional. Eu só não enxergava a escrita como algo concreto, por mais que os outros elogiassem. Pode-se dizer que a falta de referências e até mesmo o valor que um escritor tem para o mercado contribuiu. Nenhuma escola da época incluía a profissão de escritor no teste vocacional (e acredito que tampouco o façam hoje). Obrigatoriamente éramos direcionados para aquelas profissões tradicionais. Aliado a tudo isso, eu só tinha dezessete anos, em uma época onde você deveria escolher uma profissão para o resto da sua vida. Complicado, não?
Até que em 2015 eu comecei a escrever meu primeiro livro. Entretanto, depois de trinta páginas, empaquei. Isso porque em algum momento do processo, eu comentei com um colega sobre o que estava fazendo e ele recomendou que eu conhecesse um profissional que dava cursos de escrita. Pareceu interessante na época e eu passei a acreditar que se eu realmente quisesse levar aquilo a sério, e entregar algo de qualidade, eu precisaria estudar um pouco mais sobre a técnica da escrita. Como os livros são estruturados? Como se constrói um personagem? Como se adiciona camadas em sua personalidade? Como se constrói um enredo interessante? Eram livros, textos, aulas, muitas anotações. Só que quanto mais eu estudava, mais eu boicotava o meu processo. Naquela época, eu ainda não sabia, mas todo aquele conteúdo, toda aquela técnica que diziam ser essencial para escrever um bom romance, era o que estava me paralisando. Me fez, inclusive, acreditar que eu não era boa o suficiente por não conseguir escrever um livro sozinha baseado naqueles preceitos. Por isso, eu abandonei tudo. Perdi o prazer.
Então ao ouvir o podcast eu fiz uma viagem no tempo e relembre de vários fatos da minha vida, desde a escola até a vida adulta, quando tentaram me ensinar regras para se fazer algo. A primeira que me ocorreu foi durante as aulas de português onde eu tinha que decorar as regras gramaticais. Eu tentava memorizar aquelas dicas, a teoria de como uma frase deveria ser estruturada e não conseguia evoluir. Aquilo não fazia sentido para mim e por isso as minhas frases saíam todas desconectadas. O mesmo acontecia com a acentuação. Sempre que eu tentava seguir as regras, que eu tinha dificuldade em decorar, eu errava. Em um momento de desespero, resolvi ignorar tudo aquilo e seguir apenas o meu instinto. Para minha surpresa, meu rendimento melhorou e eu tive a minha melhor nota na prova de português. Ganhei até um parabéns da professora que acho que eu finalmente tinha dominado a teoria.
Então veio essa pandemia e tudo o que eu queria era criar um momento meu, mesmo que confinada dentro de casa com meu marido e duas crianças pequenas. Um momento onde eu pudesse viajar, sem sair de casa e deixar a minha imaginação flutuar. Eu até pensei em retomar o projeto do meu antigo livro e dar uma breve revisada em todo material teórico. Mas a vida já estava tão pesada, que deletei tudo. Eu queria apenas me divertir. Ignorei as regras e reescrevi a história do zero. Deixei as letras fluírem no papel. Ia e voltava no texto acrescentando pitadas que considerava ser essenciais para o aprofundamento da narrativa, um processo não linear e pouco convencional, mas que funcionou para mim. Assim que acabei de escrever, de maneira despretensiosa, mandei o texto para um editor. A ideia era saber se o livro estava bom, se tinha coerência, onde eu precisava melhorar, afinal era a minha primeira vez. Quando eu recebi sua análise, dei gritos de felicidade. Sabe aquele momento em que você diz “eu sou foda”? Foi esse. Eu estava em êxtase por ser capaz de concluir um projeto tão audacioso, do meu jeito e por receber uma análise crítica tão positiva. Fora alguns ajustes de revisão ortográfica e a sugestão de dar profundidade a uma situação, ele elogiou a fluidez da narrativa, a linguagem, os detalhes descritivos e o suspense. Eu precisei ignorar as regras para encontrar o meu caminho.
O que eu descobri nesse processo? Eu aprendi que preciso respeitar mais o meu instinto. Regras são necessárias, mas elas não podem ser aplicadas a todas as pessoas da mesma forma. Cada indivíduo é único e em algum momento precisamos entender se o que é exigido realmente faz sentido para a gente. E se não fizer, é necessário ter coragem para romper com as exigências, ou nos afogaremos em um emaranhado de informações que nos impede de progredir. Confesso que é muito difícil fazer isso no dia a dia, quando somos bombardeados com os mais diversos tipos de estratégias, ditando o passo que temos que seguir sob o risco do fracasso. Mas quando ganhamos confiança o suficiente para acreditar na gente e virar a chave…. Ah! É liberdade! Porque ausência da comparação, em muitos casos, é o ingrediente que faltava para que possamos desenvolver todo o nosso potencial e ser fiel a nossa trajetória.