Ontem eu o pedi em namoro. Pela primeira vez. Depois de tando tempo, não houve timidez, vergonha, ou aquele pensamento bobo “o que ele vai pensar de mim?”, afinal, são mais de duas décadas juntos.
O pedido foi simbólico. Uma forma de lembrar, com nostalgia, como há 25 anos achávamos que tínhamos desafios de sobra, maiores do que poderíamos carregar. Como quando ele teve que se mudar de cidade. Quando eu mudei de país. Quando achávamos que as contas não iam fechar. Quando as parcelas do nosso primeiro apartamento não acabavam, ao contrário, se multiplicavam. Quando ele perdeu pessoas que amavam. E depois eu. Quando tivemos que largar tudo e recomeçar em outra cidade, e eu tive que aprender a pedir pão francês na padaria. Quando eu perdi meu emprego, ingressei em uma nova carreira. Quando descobrimos que milagres existem. Quando recebemos um diagnóstico e logo depois o prognóstico. Quando as brigas e as diferenças pareciam ser gigantes, mas acabaram no conforto do abraço tão familiar.
A cada novo ano, um desafio que parecia ser o mais difícil. Mas jamais instransponível. Com apreensão, e uma pitada de bom humor, seguíamos em frente. E ontem, enquanto eu olhava os meninos brincando no parquinho, pensei que provavelmente não existe um desafio maior do que esse. Educar dois filhos
Por isso pedi uma cerveja. O pedi em namoro. Demos risada. Fingimos que era o primeiro encontro. Ainda que fôssemos interrompidos por pedidos apressados para ir ao banheiro. Então ele me lembrou que aquele não seria o maior desafio, apesar de eu sempre dizer isso. Demos mais risada. Porque só dois loucos embarcam em uma aventura dessas. Tentamos dar um abraço, mas fomos impedidos. De acordo com as crianças, era proibido.
Tudo bem, pensei. Para quem não gosta de ficar no mesmo lugar, sempre busca por novas aventuras, às vezes esqueço que já estou em uma. Talvez a maior que já vivi.